Adelaide

Foste tu. Foi milagre. Eu não tenho dúvidas que esse véu de esperança foi estendido por ti. Não duvido por um segundo que quando a oportunidade chegou foi por teres espalhado pelo mundo fora as rosas do teu jardim. Deste-me a bandeira que tanto quis hastear, mas a sociedade rompeu-a. Foi ela, só ela, que me disse em voz alta que há caminhos que não pertencem a este território. Mas tu deste-me a tua doce mão quando eu mais te pedi. Proclamei desesperadamente por um rumo que oferecesse dignidade ao tempo do nosso passado e, ainda que de rompante, eu senti o calor da missão cumprida. Eu fui essa bandeira, essa promessa não esquecida, fui a resiliência em forma de gente. Não tiveste culpa do sistema e da carência de liberdade que senti. Irias chorar muito ao telefone se te ligasse a contar. Tu sempre sentiste tanto quanto eu as injustiças. Mas desculpa se em algum momento te decepcionei por largar uma coisa que poderias julgar que fosse um sonho meu. Haverão ainda muitos caminhos por abraçar e que venha aquele pelo qual nada espere mas tudo tenha. Eu posso ser aquela que é do mundo, aquela que se despedaça emocionalmente para compreender as entranhas do universo, posso ser de todos, posso ser do céu e da terra, mas preciso também de ser minha. E o meu coração fala alto, ensurdece-me por vezes. Sempre fui a flor mais livre do teu jardim e a que mais quer fugir das amarras de um solo antigo e conservador em busca de um clarear chamado eu. Mas embora eu seja a mais livre sou também a que mais carece de ti. As outras vivem com água e sol, eu só vivo com amor. E foi por isso que fugi. Porque ali não existia solo fértil que me fizesse plantar o amor que me ensinaste. Era só uma ruína a querer parar o tempo próspero de quem quer sentir a vida. Fui amordaçada por um sonho agarrado à pressa. Se fôssemos máquinas seríamos as mais perfeitamente estragadas. Li as frases andantes da boa sorte, senti o negrume dos caráteres, o peso das suas tristes vidas a inflamarem quem os rodeia e, no final, o sorriso podre no rosto de quem não me soube ler. Como quem diz "sinto muito" vindo de quem nunca sentiu nada. Queimaram a minha bandeira. Mas mais uma vez tu apareceste. Mostraste-me uma porta de saída que, independentemente do que venha ser, foi a fuga necessária. Eu vivo a fugir, a reinventar-me. Poderemos nunca saber para onde queremos ir, mas sempre saberemos do que queremos fugir. Os meus dedos escorregaram pelo caule da tua rosa e já tinham passado os espinhos. O teu amor faz-me acreditar que sempre me ouves com o coração. Voltei a ser eu, e voltou o sol e a água porque tu nunca te esqueces de nenhuma flor que seja tua. Aqui vou eu hastear agora as tuas rosas com o perfume que toda a bandeira desconhece, porque eu e tu sempre fomos a entropia, a vitória que a sociedade não fala mas a felicidade escancarada que ela própria se nega a conhecer.    

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Zaask

Escritora e Fotógrafa