Encontros de café

Vivemos na Era dos encontros no café, quando tantas são as vezes que nem café se pede. Somos sábados à noite, embora preferíssemos ser domingos de sol, mas a sociedade insiste na aversão à possível relação romântica e familiar de um domingo. Existe um grande ceticismo sempre que percebo que até a flor oferecida, as migalhas da tosta ou a espuma do café, duram mais do que uma história de amor. Sentimos que somos apenas um compasso ou o eco que mora no vaso dessas flores. Sentimos ilusão, sentimos que somos aquilo que dá a escuridão à noite. Sentimos que a vida não nos olha, não nos reconhece, não nos insulta mas também não nos quer cativar. A vida torna-nos fortes mas não felizes. A vida trata-nos como cobaias emocionais. Achamos que é apenas falta de sorte, na esperança de algo maior surgir, mas não passamos de iscos que alimentam a maior das blasfémias: um amor recíproco. Somos como cápsulas incubadoras de sentimentos, como um mero deleite para olhos alheios. Somos como uma carta escrita até ao fim mas entregue no correio errado. As pessoas desinteressam-se sem antes terem sentido interesse. Abandonam-se sem antes terem pedido para ficar. Isolam-se sem nunca terem conquistado a companhia de alguém. Por razões inconscientes ao ser humano e ilógicas ao universo do destino, todos promovemos o nosso próprio desencontro. Todos nos julgamos muito seletivos, mas se a triagem fosse connosco será que caberíamos nessa ilusão? Todos nos cansamos do carinho em exagero, o mesmo que pedimos todas as noites. Cansamo-nos daquilo que desejamos e ansiamos aquilo que não aprovamos. Este é o amor deste século: uma contradição translúcida, uma eterna indecisão, uma espera pela compaixão. Ora nos focamos nos outros e nos desencontramos de nós, ora nos focamos só em nós e nos desencontramos dos outros. Vivemos de surtos incompreendidos, de encontrões que a pele não sente. Somos a própria blasfémia que contraria o amor. Todos estamos na equação. Todos perguntamos se podemos entrar na vida de alguém, de uma forma ou outra, mas ninguém pergunta se pode sair. Todos queremos demonstrar domínio afetivo no começo, mas preferimos terminar como vítimas ou vilões quando fugimos e nos desculpamos por nada sabermos acerca do amor. Sabemos tanto de amor que somos peritos em destruí-lo. Prefiro criar a minha Era romântica e amar as flores tanto como amo as pessoas. Prefiro depositar o meu porto seguro emocional apenas em locais seguros, junto dos anjos do céu e dos aromas do jardim. Prefiro não me importar com os meus sentimentos nem os dos outros. Escolho a amnésia porque escolho o destino. E há destinos que só nos mantêm acordados com um café.

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Zaask

Escritora e Fotógrafa