Minha Mãe

 (texto concebido para a Chiado Editora, livro "Minha Mãe" - Vol I)

É de nós que o mundo fala sempre que se ousa falar de amor. Um amor complexo, repleto de conversas de mulher para mulher. Dataram-se lágrimas, tempestades, respostas agridoces e anos de incompreensão. Foi sempre a forma do amor se transmitir.

Era só uma mãe a querer guardar um tesouro, era só uma filha acabada de se conhecer mulher. Era só uma mãe a tentar explicar como é gigante ser-se mulher, e eu era só uma mulher acabada de se descobrir como filha.

Eu fui perturbada, fui louca, fui difícil, fui intensa, mas também foi a minha linguagem de posicionamento. Contra tudo e todos, eu soube ser eu. Não sei como e quando o aprendi, nem sequer sei se estive mais perto de ser filha ou de ser mulher, mas tive a certeza de ter uma alma imutável.

 Antes de seres mãe já eras mulher e eu fui mulher ao mesmo tempo que fui filha. Foi difícil assimilar tanto. Ver a tua beleza, as tuas conquistas e assumir-me como a filha de uma inspiração tão forte e garrida, uma mãe tão poderosa e, ao mesmo tempo, ter que ser isto ou aquilo quando atender aos perigos de ser mulher já era tão difícil.

Não sei se fui o que querias que fosse mas sei que tenho sido muito. Eu sou muito.

E sou tudo isto porque sou o resultado das nossas contradições, do teu não, dos meus sins, da nossa indefinição. Sou o produto da tua proteção e da minha insistência em falhar. Há beleza nesta singular contradição, nesta forma radiante de errar. As nossas barreiras fizeram crescer flores peculiares na minha bravura.

Trata-se afinal de um amor fácil de entender. O de eu ser tua e tu seres minha. Para sempre.

Comentários

Zaask

Escritora e Fotógrafa