Limbo chamado "eu"


Deixem-me ser volátil, deixem-me querer voar perto do sol e queimar as minhas asas, deixem-me ser inconstante e inconsequente, deixem-me ser precoce na minha forma de ser feliz. O amor será sempre precoce para aqueles que não sabem amar. E o amor existe não apenas para o objeto amado mas pela necessidade intrínseca de amar, porque amar é como transbordar de nós mesmos. É como seres água a fervilhar e a querer sair do teu copo, dos teus limites.
Permite-te atirar sem pára-quedas, sem segurança física mas com a segurança emocional que te evita o medo da queda. A vida não é mais do que o limbo entre equilíbrios e desequilíbrios, entre boas e más escolhas, entre apostas promissoras e sonhos que falharam, entre a liberdade da partilha e o amor à confidência. Será sempre limbo, será sempre incerteza. Quando escorregarmos toda a incerteza se esvairá, e aí deixará de ser limbo, deixará de ser vida. Deixarei de ser eu. Se nos habituarmos a fazer somente escolhas seguras e racionais deixa de existir o fator erro, deixa de existir o prato da balança que carrega o desequilíbrio. O limbo ficaria destruído. Há algo de bonito nas nossas falhas e indecisões. Há algo de bonito no excesso que existe na realidade e no nosso excesso ao amá-la. Há descoberta pessoal. Talvez seja impossível sincronizar a mente com o coração e é por isso que faço do limbo o meu auto-retrato. Não o limbo que representa um ponto equidistante de mente e coração, mas um limbo que representa a fuga para os pólos opostos do espetro. Esperem de mim intelectualidade ou então esperem de mim um coração estupidamente aberto. Talvez possam esperar ambos em simultâneo. A verdade é que a razão e a emoção sustentam esse limbo, esse nosso eu racional que busca a vitória e esse nosso eu emocional que busca o sabor dessa vitória. Sem emoções não saboreamos coisa alguma, não discernimos entre o bem e o mal, tornamo-nos seres indiferenciados e focados apenas em sobreviver. Embora, por vezes, nos queiramos tornar inertes ao atrito da vida, o que restaria de nós sem esse atrito? Nós somos esse atrito, o começo e o fim da nossa instabilidade, porque é o imprevisível que nos faz sentir vivos. E é a simulação de sensações em relação ao que nos é apelativo ou não, que define a nossa decisão racional. E desta forma consigo perceber com lucidez que são as emoções a conduzir o limbo, a conduzir a vida. Não a sustentá-la, mas a conduzi-la. Poderemos ser um conjunto de escolhas racionais, mas só as emoções são em nós inatas. Só nelas é que está depositado o nosso ser, a nossa essência. 
Sou um limbo apaixonado, viciado, excêntrico. Sou um limbo que se julga arte porque tentar sê-lo já o é, por si só. Existe algo bonito e precioso dentro de todos nós. Existirá sempre uma cura que nós criamos para os males que nós mesmos semeamos. É esse o lado inofensivo das emoções, terem tanto de sufocantes como de abstractas. Sabemos que podemos ser um fantoche perante elas, mas também sabemos que temos a força humana para dominá-las. Não a razão, mas a força.

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Zaask

Escritora e Fotógrafa