Crença

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Enquanto um sonho não se concretiza parece que é tudo tão lento e custoso, mas deveras desafiante, e quando um sonho se realiza parece que foi tudo depressa demais. E esse depressa demais resume-se à nossa existência, aquele sopro a que chamamos de vida. Como se o carvão que nos mantém quentes acabasse, como se a inutilidade emergisse. Como se fôssemos pequenos demais para abarcar os nossos sonhos e demasiado fracos para tomar as rédeas do seu seguimento. Como se, afinal, nenhum de nós estivesse realmente preparado para colher e nutrir um sonho. Como se o nosso trajeto de vida se baseasse numa luta pela ilusão, como se a vida se alimentasse do seu próprio estímulo. E é exatamente isso. O que faz os seres humanos dominar o mundo é a sua crença em algo. Seja um racional que só acredite nos valores morais e nas leis, seja um viajante que faz do sol a sua bússola, seja um pescador que reze para atenuar a força das marés, seja um poeta que sonha em ser correspondido, seja um atleta que sonhe em rasgar a meta, seja um louco que grite na rua por acreditar que vai ser ouvido, seja um religioso que carrega a bíblia ao peito, seja um amante de festas que acredita no prazer do momento, seja um político que acredita que pode fazer a diferença, seja um ditador que acredita no impacto das suas palavras, seja um mendigo que acredita que o sol irá nascer amanhã, seja uma criança que acredita na inocência das pessoas, seja quem for, sejas tu, seja eu mesma. Todos nos baseamos em algo que acreditamos. Chamemos-lhe de essência, de valores ou de educação, mas a verdade é que não é nada mais do que a esperança em formato de crença. Não pode haver céticos perante a vida, quem só acredita no que vê não poderá nunca lutar por um sonho, porque a vida é isso mesmo, é a luta por algo que traça a nossa rota. Cada pormenor da nossa vida é desenhado em parte pelo futuro, pelo ambíguo, por aquilo que ainda está por realizar. Somos feitos das pessoas com quem lidamos, dos locais que visitamos, dos livros que lemos, dos pedaços de sacrifício que carregamos mas, principalmente, somos feitos de sonhos e ambições. Somos criados a partir do desconhecido e é com vista ao desconhecido que vivemos. Não importa a cor da nossa medalha, importa aquilo em que nos tornámos ao lutar por ela, não importa o sabor amargo de algumas quedas, importa a forma como aprendemos a levantar-nos. Importa que continuemos de pé em nome da convicção que temos em algo ou alguém, continuamos de pé porque temos forças e ter força é sinal de que a crença existe, é sinónimo de poder sobre nós mesmos. Todos nós acreditamos em algo superior a nós que nos sustém. Chamem-lhe lema de vida ou vontade de viver, chamem-lhe destino ou bruxaria, chamem-lhe Deus ou fé, mas nomeiem-no como o objetivo pelo qual estão vivos e conscientes. O curto espaço de tempo em que vivemos só poderia ser criado para que lutemos, para que o fervor da conquista assuma o nosso dever. Que sentido faria vivermos tão pouco e ver continuamente os sonhos concretizados? A não concretização é o que faz brotar os pilares da fé. A frustração consome-nos por momentos mas é ela que, a longo prazo, nos dá a força incansável de retomar a caminhada. Recebamos com carinho todo o sofrimento passado, toda a revolta que nos queimou por dentro, toda a desilusão e falsidade, porque sentir dor é estar vivo. Se nos erguemos face a tudo isso é porque somos os maiores amantes da vida, porque conhecemos da vida o melhor e o pior e, ainda assim, continuamos a amá-la e a recebê-la todos os dias em que acordamos. Acarinhemos as nossas mãos magoadas, a nossa voz cansada, a nossa face enrugada e o nosso coração desfeito porque é sinal de que tudo valeu a pena. É sinal que não andámos à deriva, mas que remámos contra as imperfeições da vida e que soubemos retirar dela as maiores lições. Tudo porque acreditámos. Não importa em quê nem em quem, mas acreditámos. 

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Zaask

Escritora e Fotógrafa